QUIIV, Ucrânia (AP) – A proposta dos EUA para acabar com a guerra na Ucrânia coloca o país numa situação diplomática delicada; Está dividido entre apaziguar o seu aliado mais importante, os Estados Unidos, e não capitular perante o seu vizinho muito maior, a Rússia, que lançou uma invasão em grande escala há quase quatro anos.
O plano de paz de 28 pontos foi preparado pela administração do presidente dos EUA, Donald Trump, e pelo Kremlin, sem a participação da Ucrânia. Aceita muitas das exigências da Rússia que o presidente ucraniano, Volodymyr Zelenskyy, rejeitou categoricamente dezenas de vezes, incluindo a renúncia a grandes extensões de território.
O presidente russo, Vladimir Putin, saudou a proposta na sexta-feira, dizendo que ela “poderia formar a base de um eventual acordo de paz” se os Estados Unidos conseguirem que a Ucrânia e os seus aliados europeus concordem.
Falando em tom diplomático durante o seu discurso à nação na quinta-feira, Zelenskyy disse que o seu país precisava de uma paz que garantisse que a Rússia não invadiria novamente. Ele disse que trabalharia com a União Europeia e os americanos.
Aqui damos uma olhada nos elementos-chave da proposta e parte do contexto que os rodeia.
Concessões territoriais
OFERTA: Embora o plano afirme que confirmará a soberania da Ucrânia, afirma que a Crimeia e as regiões de Luhansk e Donetsk serão reconhecidas como território russo de facto, inclusive pelos Estados Unidos. De acordo com a proposta, as fronteiras de duas outras regiões (Kherson e Zaporizhia) que a Rússia ocupa parcialmente e reivindica como suas serão congeladas ao longo da linha da frente.
Dado que a Rússia não controla Luhansk e Donetsk, o plano permitiria essencialmente à Ucrânia retirar-se de áreas que a Rússia não poderia reivindicar na guerra. Esta zona de retirada seria considerada uma zona tampão neutra e desmilitarizada, reconhecida internacionalmente como pertencente à Rússia.
A proposta também afirma que a Rússia desistirá de todas as regiões que controla, exceto cinco regiões; Estas incluem áreas ao redor da região nordeste de Sumy, onde as forças russas atravessam a fronteira, e a região oriental de Kharkiv, que faz fronteira com a Rússia, mas os detalhes não são claros.
CONTEXTO: Zelenskyy afirmou repetidamente que a Ucrânia nunca reconhecerá os territórios ocupados como parte da Rússia.
Oleksandr Merezhko, presidente da comissão parlamentar de relações exteriores da Ucrânia, disse que o principal problema do plano para os ucranianos reside nas suas contradições. Disse que o acordo começou por garantir a soberania da Ucrânia, mas depois enumerou muitos pontos que dificultariam ou violariam essa soberania.
Merezhko disse que o plano “falhou definitivamente, mas não descarto que isso possa ter feito parte do jogo de Trump”. “Começa com algo completamente absurdo, ridículo, chocante, e então faz mais sentido.”
Garantias de segurança
PROPOSTA: O plano diz que a Ucrânia deve incluir na sua constituição um compromisso de não aderir à NATO, e que a NATO deve adoptar uma disposição segundo a qual a Ucrânia não será admitida no futuro. O tamanho do exército ucraniano será limitado a 600 mil soldados e as forças da NATO serão proibidas de estacionar na Ucrânia, uma medida que restringirá o direito de Kiev de escolher com quem coopera militarmente.
O plano atende às esperanças da Ucrânia de adesão à União Europeia, dizendo que Kiev deveria receber acesso privilegiado de curto prazo ao mercado europeu, ao mesmo tempo que tenta implementar reformas para alcançar os padrões exigidos para a adesão à UE, incluindo a luta contra a corrupção.
O plano também menciona as garantias de segurança dos aliados ocidentais da Ucrânia, mas não entra em detalhes. Não está claro como os Estados Unidos garantirão que a Rússia não invada novamente.
CONTEXTO: Zelenskyy sugeriu repetidamente que a adesão à NATO seria a forma mais barata de garantir a segurança futura da Ucrânia. Desde que assumiu o cargo, o Presidente Trump deixou claro que a adesão à NATO está agora fora de questão.
Os 32 Estados-membros da NATO afirmaram no ano passado que a Ucrânia estava num caminho “irreversível” para a adesão. Mas alguns membros da NATO, liderados pelos Estados Unidos, abstiveram-se de avançar com a Ucrânia enquanto a guerra estava em curso e antes de as fronteiras do país estarem claramente demarcadas.
Expansão da OTAN
OFERTA: O plano afirma que a Rússia não invadirá os países vizinhos e a OTAN, a maior aliança militar do mundo, não se expandirá ainda mais.
CONTEXTO: As decisões da NATO são tomadas por consenso e não há votação por maioria. Os Estados Unidos são de longe o maior e mais influente membro da OTAN. Washington tem tradicionalmente conduzido a agenda, mas recuou sob a administração Trump. A aliança é o único fórum internacional em que os Estados Unidos concordaram em negociar o seu poderio militar e podem ser persuadidos pelos seus aliados a agir de forma diferente.
Responsabilidade pelas ações da Rússia
OFERTA: O plano também exige que a Ucrânia abandone as suas reivindicações de responsabilizar a Rússia pelas suas ações na Ucrânia.
CONTEXTO: Isto eliminaria a possibilidade de milhares de ucranianos procurarem indemnização ou verem o seu sofrimento legalmente justificado. Especialistas em direitos humanos apoiados pela ONU dizem que a tortura de civis e prisioneiros de guerra ucranianos pela Rússia é um crime contra a humanidade.
O analista político ucraniano Volodymyr Fesenko disse que assinar o plano seria um “desastre” para Zelenskyy.
“Mas o problema é que não podemos dizer não a Trump porque haverá uma forte pressão da Casa Branca”, disse ele.
Ele também disse que partes do plano, como a declaração da Ucrânia de país neutro ou a concessão de status oficial à língua russa, exigiriam mudanças na constituição da Ucrânia. Estas medidas só poderiam ser tomadas através do parlamento, não de Zelenskyy.
“A Ucrânia pode oferecer-se para realizar um referendo sobre estas questões; isto é um compromisso”, disse Fesenko.
Ativos congelados da Rússia
OFERTA: O plano exige que Moscovo concorde em investir 100 mil milhões de dólares dos seus activos congelados na reconstrução da Ucrânia.
CONTEXTO: As autoridades russas irritaram-se com a ideia de usar bens congelados para ajudar a Ucrânia. “Se alguém quiser roubar as nossas propriedades, os nossos activos, utilizá-los indevidamente e beneficiar dos lucros desses activos, então é claro que os envolvidos nisto serão processados de uma forma ou de outra. Todos serão responsabilizados”, disse o porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, no mês passado.
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A redatora da Associated Press, Dasha Litvinova, em Tallin, Estônia, contribuiu para este relatório.



