Um estudo recém-lançado descreve como os pesquisadores colaboraram para projetar o primeiro roteiro abrangente para proteger a vida microbiana. O trabalho foi liderado pelo Professor Jack Gilbert, Cátedra Internacional de Microbiologia Aplicada.
O trabalho é apresentado em um artigo intitulado “Conservando a biodiversidade microbiana: o Grupo de Especialistas em Conservação Microbiana (MCSG) dentro da Comissão de Sobrevivência de Espécies da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN)”, publicado em microbiologia sustentávelum jornal da AMI.
Novo esforço global lançado através da UICN
Em julho de 2025, a UICN estabeleceu formalmente o MCSG no âmbito da sua Comissão de Sobrevivência de Espécies. O grupo é co-presidido pelos Professores Gilbert e Raquel Peixoto (KAUST/ISME). A organização foi formada após um workshop em maio liderado pelo Professor Gilbert, que reuniu especialistas em conservação e microbiologistas para explorar como os objetivos tradicionais de conservação podem ser aplicados a um mundo movido por processos microbianos.
O Professor Gilbert disse: “Esta é a primeira aliança global dedicada a proteger a diversidade microbiana, os ‘99% invisíveis da vida’, para garantir que os microrganismos sejam reconhecidos como vitais para a ecologia, o clima e os sistemas de saúde do planeta.”
Ele acrescentou: “Penso que isto reformula a conservação, passando de salvar espécies individuais para proteger a teia invisível da vida que torna possível a vida visível, o que é uma mudança de paradigma para a saúde planetária. Também nos dá uma visão real das ferramentas microbianas que podem apoiar a acção de conservação para que possamos usar a microbiologia para resolver os maiores problemas do mundo”.
Por que a biodiversidade microbiana é importante para o planeta
Os microrganismos são vitais para a fertilidade do solo, a ciclagem do carbono, a produtividade dos oceanos e a saúde animal e vegetal. Apesar disso, raramente aparecem nas políticas de conservação. O Professor Gilbert observou que ignorar a diversidade microbiana poderia prejudicar a resiliência climática, a segurança alimentar e os esforços de restauração dos ecossistemas. “O MCSG preenche esta lacuna ao incorporar a microbiologia diretamente nos mecanismos de conservação da IUCN, utilizando critérios da Lista Vermelha, avaliações de ecossistemas e planos de restauração, para que os microrganismos sejam visíveis nas políticas, e não apenas na ciência”, explica.
Estabelecendo uma rede global para orientar a conservação microbiana
Nos últimos dois anos, os membros fundadores reuniram uma comunidade internacional de microbiologistas, ecologistas, juristas e detentores de conhecimento indígena de mais de 30 países. Juntos, eles criaram o primeiro roteiro para a conservação microbiana, delineando os cinco componentes principais do ciclo de conservação das espécies da IUCN:
- Avaliar — Desenvolver indicadores compatíveis com a Lista Vermelha para comunidades microbianas e biobancos.
- planejamento — Criação de um quadro ético e económico para intervenções microbianas.
- Ação — Projetos-piloto de restauração utilizando soluções microbianas (probióticos de coral, microbioma de carbono do solo, vida selvagem resistente a patógenos).
- rede – Conectando cientistas, coleções culturais e guardiões indígenas em todo o mundo.
- comunicações e política — Lançar campanhas públicas e políticas, incluindo “Invisível, mas Indispensável”.
Os primeiros trabalhos foram apoiados por uma bolsa da Fundação Gordon & Betty Moore e apoio em espécie da AMI e ISME. A primeira fase centra-se no mapeamento de hotspots microbianos, no estabelecimento de índices de conservação e na ligação de biobancos microbianos existentes num arquivo global coordenado.
Superando desafios científicos e éticos
O professor Gilbert explica que a criação de uma estrutura protetora para a vida microscópica encontra obstáculos científicos e conceituais complexos. Esses desafios incluem:
- Determinação da elegibilidade para “espécies microbianas” dentro dos critérios da Lista Vermelha.
- Integrar informações genômicas e ecológicas em sistemas originalmente desenvolvidos para plantas e animais.
- Aborda a ideia de que os microrganismos são demasiado adaptáveis ou complexos para necessitarem de proteção.
“A conservação microbiológica deve enfrentar uma vasta diversidade invisível e estruturas comunitárias altamente dinâmicas que desafiam os conceitos clássicos de espécies. A instabilidade taxonómica, a falta de linhas de base a longo prazo e o tratamento ético de amostras microbianas, incluindo a microbiota indígena ou associada ao homem, exigem novas definições de ‘perda’, ‘recuperação’ e ‘direitos microbianos'”, disse ele.
Ele acrescentou: “Mas um marco importante ocorreu quando a UICN aprovou o MCSG como um grupo formal de especialistas – estendendo formalmente a proteção global aos microrganismos pela primeira vez”.
Próxima fase do plano de trabalho de conservação
Os próximos objetivos da equipe incluem:
- Desenvolver a primeira estrutura da Lista Vermelha microbiana até 2027.
- Crie um mapa global de pontos críticos microbianos no solo, no oceano e em sistemas associados ao hospedeiro.
- Testar estratégias de conservação, como biorremediação microbiana, probióticos de corais e restauração de carbono no solo.
- Garantir que os indicadores microbianos sejam integrados nas metas de biodiversidade da UICN e das Nações Unidas, juntamente com as plantas e os animais, até 2030.
O que é necessário para o progresso a longo prazo?
O investimento contínuo é essencial para expandir a rede global de vigilância microbiana. O progresso futuro também depende da integração dos micróbios nas estratégias nacionais de biodiversidade e clima, incluindo as políticas “30 por 30” e “Uma Só Saúde”. Outra prioridade fundamental é construir “alfabetização microbiana pública – o reconhecimento de que os micróbios são fundamentais para os ecossistemas e a saúde humana”. O roteiro também destaca a importância dos gêmeos digitais e das ferramentas de inteligência artificial na previsão de como as comunidades microbianas respondem às mudanças ambientais.
O artigo foi publicado hoje (20 de novembro) em microbiologia sustentável.



